domingo, 7 de outubro de 2012


O Algarve Esquecido: O Algarve Dalém Mar  

 

 

         Não deixa de ser curioso o fascínio que, desde sempre, as terras de Marrocos têm representado no imaginário português. A Batalha de Alcácer Quibir, conhecida em Marrocos como Batalha dos Três Reis ou batalha do wâd Mahzane (rio perto do qual se travou a batalha), deixou marcas profundas na mentalidade portuguesa, sendo a lenda de D. Sebastião e o “sebastianismo” uma consequente realidade daí resultante.

A verdade é que existe um profundo desconhecimento por parte da generalidade dos portugueses em relação à empresa norte africana, cujos contornos começaram a ser lenta e paulatinamente desenhados pela dinastia de Avis. Qual a razão desta falta de conhecimento? Com efeito, parece que a historiografia nacional sempre olhou com certa desconfiança ou mesmo com alguma displicência, a guerra portuguesa no Algarve de Dalém Mar. A verdade é que a guerra em Marrocos não foi menos nobre que as outras guerras travadas pelos portugueses nos outros cenários bélicos espalhados um pouco por todo o mundo. Muito pelo contrário. Assim sendo, a que se deve a falta de importância concedida à presença militar portuguesa em Marrocos? A questão parece ter sido, desde sempre, analisada erroneamente pela historiografia nacional, pois ao invés de encararmos a presença portuguesa em Marrocos como uma colonização mal sucedida, devemos antes encará-la como o que efectivamente foi, pelo menos a partir do desastre de Mamora de 1515, ou seja: uma autêntica “escola prática de guerra” destinada a formar os fronteiros e demais efectivos militares num cenário bélico sangrento e hostil, para posteriormente serem enviados para outras possessões portuguesas, nomeadamente na África oriental, Índia e restante Ásia.

Se analisarmos atentamente as carreiras militares dos capitães que serviram em Ceuta, Alcácer Ceguer, Tânger, Arzila, Azamor, Mazagão, Safim e Santa Cruz do Cabo Guê, rapidamente nos apercebemos que estes militares eram frequentemente nomeados para os governos de regiões e possessões economicamente mais importantes, nomeadamente no Brasil ou outros lugares de relevância pertencentes a Portugal, depois de servirem nas praças portuguesas do Norte de África. Ora, não podemos partir do inverosímil pressuposto que a política portuguesa face a Marrocos dos inícios do séc. XV fosse igual à política marroquina de meados do séc. XVI ou à de finais do séc. XVIII! A guerra portuguesa no Algarve Dalém Mar sempre atendeu e adaptou-se aos interesses dos mais variados monarcas portugueses, não devendo ser esquecida, mas antes valorizada por ter servido de “escola prática de guerra” aos sucessos militares portugueses verificados no mundo da Idade Moderna.

 

Jornal do Baixo Guadiana, Nª 141, Fevereiro de 2012, p.20.

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